O Ministro Mangabeira Unger, da Secretaria de Assuntos Especiais, contrata Berta Becker para estabelecer propostas curtas e eficazes para a Amazônia. O Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE) se mostrou como um instrumento politicamente frágil e tecnicamente ineficiente. Pois do ponto de vista técnico ele homogeniza – trazendo um choque de ordem – para uma situação que é emaranhada de realidades locais, e do ponto de vista político ele é facilmente alterado pelas elites regionais, pois trata-se de uma Lei estadual. Como exemplo o ZEE de Rondônia, o 1º do Brasil, havia uma zona destinada à conservação no centro do Estado, localidade sem estradas e sem cidades, apenas vegetação nativa. Neste local o INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) estabelece um programa de assentamento para 500 famílias, que logo tornou-se 5.000 famílias; e, ao modo da política regional, com propinas e favorecimentos, a Assembléia Legislativa altera o ZEE para Zona de Uso Intensivo nesta área. Com esta análise, o ex-Ministro Unger apostou que a Regularização Fundiária seria mais eficiente do que o ZEE para a promoção do Desenvolvimento Sustentável na região amazônica. O INCRA foi o maior óbice para essa regularização, alegava que seria impossível, tendo em vista a complexidade do tema, que envolvia o sistema cartorial, Conselho Federal de Engenharia, interesses das elites locais... No entanto, o Presidente da República, por conhecer o problema in locu e os benefícios do projeto, sinalizou positivamente, reconhecendo que seria um importante passo para a solução dos conflitos na região.
A então Ministra Marina Silva trabalhou para que a regularização sem licitação fosse para os imóveis com menos de 500 ha, e apenas para agricultores familiares. O problema é que isso deixava de lado a classe média rural da Amazônia (pecuaristas, donos de garimpos, sojicultores), que tem um poder de mobilização muito grande. Na Amazônia os Módulos Fiscais são variáveis, sendo, por exemplo 1500 Ha no Amazonas e 60 Ha em Rondônia. O Projeto Aprovado estabelece a regularização sem licitação e gratuitamente para áreas de 1 a 4 módulos fiscais e, com o valor de mercado para áreas de 4 a 15 módulos. Por outro lado, existe um posicionamento defendido por alguns grupos, de que a terra regularizada não pode ser comercializada. [Exemplo das sesmarias que eram hereditárias, e não podiam ser vendidas, mas devolvidas ao Estado] .
O relator do projeto da Câmara incluiu que fosse possível a comercialização para áreas médias em 3 anos e 10 anos para as pequenas. Marina Silva, já novamente como Senadora do Acre (na época ainda pelo PT), e diversas ONGs, foram contrárias a essas alterações. A Senadora Kátia Abreu (DEM-TO), que também é presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), foi a relatora no Senado, e não proferiu nenhuma alteração ao texto vindo da Câmara, pois isto atrasaria o processo, e assim, o projeto foi aprovado na íntegra. O Presidente Lula vetou apenas as regularizações para pessoas jurídicas e ocupações indiretas.
História Fundiária da Amazônia
Até 1971 todas as terras devolutas da Amazônia eram estaduais. Os Governos entregavam terras a diversas pessoas, não era mercadoria. Até que com a abertura da Rodovia Belém-Brasília – integrando a região ao eixo nacional na década de 1960 – passa a ser. O Decreto Lei 1.164/71 tornou Federal grande parte das terras devolutas localizadas ao longo das Rodovias Federais na Amazônia (Transamazônica, Cuiabá-Santarém, Manaus-Porto Velho, dentre outras). Rondônia foi quase que totalmente federalizado. Estas áreas foram usadas para projetos de Colonização Agrária via INCRA, movimentando a migração de brasileiros do sul e do nordeste para a região. Este fluxo foi tão intenso, que no final dos anos 1970 já não havia mais controle público sobre as ocupações, trazendo grandes conflitos agrários.
O INCRA, nos anos 1980, com a crise fiscal e a democratização, passa a ser usado com moeda de troca política pelas elites locais, e como forma de pressão aos inimigos. Ou seja, aos aliados terra, aos inimigos a Lei. Levando esse órgão a ser um dos mais fortes da região, contrapondo seu papel no restante do país. Até que em 2008, o Conselho Monetário Internacional baixa a Resolução 3545, ratificada pelo Brasil, cujo fundamento é o de cortar o crédito aos países com passivo ambiental, ou que usarem recursos para prejudicar a qualidade ambiental, [uma reivindicação histórica dos ambientalistas – como Chico Mendes – que combatia o financiamento público da destruição da Amazônia, através de grandes investimentos em Infra-Estrutura e Projetos Agrícolas]. Assim, inicia-se uma mudança na política de controle de desmatamento pelo Governo Federal, onde o IBAMA se torna protagonista. Este movimento pode explicar a redução do desmatamento na região de 20.000 Km² anuais no período de 1992 a 2005, para os atuais 5.000 Km².
Pereira¹ afirma que que através da regularização fundiária pode-se resolver muitos conflitos, inclusive os ambientais, por isso defende a Lei 11.952/09, que torna possível a legalização de posseiros (alguns invasores) que ocuparam a terra até o ano de 2004 na Amazônia.
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¹ PEREIRA, Alberto Carlos Lourenço . [palestra] 23 jun 2010, Brasília (Seminários Interdisciplinares, Programa de Pós-Graduação do Centro de Desenvolvimento Sustentável, Universidade de Brasília). Plano Amazônia Sustentável e Regularização Fundiária.
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