Balizamento conceitual e relevância
Cláudio Carrera Maretti
Beatriz B. Aydos
Victor B. Ferraz
Ângela C. Guirao
Juliana Echeverri
Sueli A. Thomaziello
André L. Lima
Rodrigo Martins dos Santos
Gabriel N. Fenerich
Sueli Angelo Furlan
Marta de Azevedo Irving
Resumo
O quadro legal brasileiro supõe a implementação
de UCs pelos governos locais. A tradição da gestão urbana de qualidade define
espaços livres, parques urbanos e áreas verdes. Este artigo trata desses e
outros tipos de áreas,no interesse da sociedade, expresso sobretudo no nível local
e em relação às cidades. Trata da importância dos sistemas dessas áreas
protegidas, verdes e azuis,locais e as diretrizes que devem considerar, como um
conjunto integrado, interativo, dinâmico e evolutivo, para resultados e
impactos positivos. Esses sistemas precisam ser reconhecidos no âmbito da
conservação da biodiversidade. Como somos progressivamente sociedades urbanas,
são fundamentais na promoção da saúde e do bem-estar e no enfrentamento das
mudanças climáticas, que já chegaram. Interessa que sua governança seja
participativa e inclusiva e que haja contribuição efetiva para a qualidade de
vida dos grupos sociais que habitam as cidades, com eficácia e equidade.
Introdução
Quando se pensa
em áreas protegidas, normalmente se associa a UCs (UCs), principalmente as
federais, por vezes seguidas das estaduais. Além disso, quando se pensa em
áreas protegidas, a associação com a conservação da biodiversidade é muito
forte e os biomas e ecossistemas mais emblemáticos,mesmo mais distantes, são os
mais evocados – como Amazônia, Pantanal. É mais raro que se lembre das áreas protegidas locais ou urbanas.Isso
se deve ao fato de que as UCs são o tipo mais importante de áreas protegidas no
Brasil para a conservação da natureza e da sua biodiversidade. Diferente de
muitos países, o Brasil tem uma lei geral que estabelece o sistema nacional de UCs,
o qual prevê que todas as categorias de gestão podem ou devem ser criadas nos
três níveis de governo(Lei nº 9.985, 2000, a Lei do SNUC).
Além disso, tem sido dada
relativamente pouca atenção aos sistemas, sejam eles de UCs ou de outras áreas
protegidas, assim como a outros serviços fundamentais que os ecossistemas e as
áreas protegidas e verdes prestam. Ao considerar a qualidade de vida das
pessoas (ressaltando que grande parte da população é urbana, 85%, segundo IBGE),
especialmente com relação a saúde, bem-estar e enfrentamento das mudanças
climáticas, deve ser considerada a importância, não só das UCs próximas, mas
também das demais áreas protegidas, conservadas, verdes e azuis.
A instabilidade na gestão e governança das UCsnos tempos atuais e a
necessidade de criar estratégias cada vez mais perenes e integradas, faz com
que seja necessário considerar a importância dos papéis complementares entre os
três níveis de governo e com os outros tipos de governança de áreas protegidas,
inclusive privados e comunitários.
Neste artigo tratamos de áreas protegidas e verdes e
azuis locais, incluindo vários tipos e
categorias - como as UCs, as áreas que contribuem com a conservação da
natureza, os territórios tradicionais, os espaços vegetados e aquáticos
destinados ao lazer ou à qualidade da paisagem -, consideradas também individualmente,
mas preferencialmente em seus conjuntos
e sistemas, em sua complexidade e no relacionamento com seus contextos, especialmente na lógica
urbana das cidades. Dessa forma, quando mencionamos, simplificadamente, apenas
‘áreas protegidas e verdes’, ou expressão similar,solicitamos que o conceito
seja entendido no seu sentido mais completo e complexo.
(...)
Conclusões ou considerações finais
Os sistemas de
áreas protegidas e verdes devem contribuir para a qualidade de vida de todas as
pessoas e todos os grupos sociais, especialmente nas cidades. Uma das
expressões internacionais mais importantes atualmente são os Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável, inclusive o ODS 11 – Cidades e Comunidades
Sustentáveis, além da Nova Agenda Urbana (ONU, 2016). Assim, para cidades e
comunidades mais saudáveis, são fundamentais as capacidades de entender o papel das áreas naturais,
protegidas ou verdes e de conhecer e
atuar nos espaços de planejamento, ordenamento e gestão das cidades.
É crescente a importância das
relações entre as funções das áreas protegidas e verdes e as cidades, governos
locais e grupos sociais e a resiliência baseada em ecossistemas e a promoção do
bem-estar e da saúde. Embora a valorização das áreas protegidas locais como
ferramentas eficazes de conservação da natureza e de promoção da qualidade da
vida humana tenha aumentado ao longo dos anos, é necessário um enfoque mais sistêmico e integrado, uma vez que
essas áreas, sozinhas e fragmentadas, não conseguem alcançar plenamente os seus
objetivos.Assim, os planos e os sistemas municipais de áreas protegidas e
verdes são instrumentos de extrema relevância para a qualidade de vida das
sociedades humanas, especialmente nas cidades, além de suas funções para a
conservação da natureza e os associados serviços ecossistêmicos. O
desenvolvimento de estratégias de longo
prazo, com participação e transparência, incluindo monitoramento
participativo e prestação de contas, além da aplicação dos princípios de
equidade na governança e na gestão das áreas individuais e dos sistemas é
fundamental para a efetividade dessas áreas.
Destacamos
umas das principais recomendações deste artigo: a integração entre os sistemas
de áreas protegidas com objetivos de conservação da natureza, tipicamente
nacionais, e os sistemas de áreas protegidas, verdes e azuis que promovem a
qualidade de vida sobretudo nas cidades, tipicamente locais, municipais. Precisamos
que o SNUC seja mais atuante, como um sistema, incluindo os níveis estadual e
municipal. É fundamental a inclusão de todas as UCs municipais no CNUC, além do
estabelecimento de um mecanismo de registro para OMECS para que possam aportar
para o cumprimento das metas brasileiras no cenário global. Existe um debate
inicial sobre o cadastramento de áreas verdes, o que seria interessante. Mas o
fundamental seria o apoio aos processos municipais de planejamento e gestão de
sistemas de áreas protegidas e verdes. O entendimento e busca pela
complementaridade entre as áreas, os tipos e as categorias, e entre os
parceiros de sistemas que extrapolam o município (buscando um SNUC como um “SUS
ecológico”) representa um marco importante na construção destes processos
municipais de gestão. Para isso, também se faz necessário instituições gestoras
fortes, capazes, reconhecidas, com bom relacionamento entre elas e com
orçamentos adequados e estratégias financeiras complementares e integradas
(como um “FUNDEB das áreas protegidas”).
Para promover a boa qualidade de
vida e, portanto, para também superar os problemas de baixa prioridade da
conservação da natureza e das áreas protegidas e verdes e azuis, além do
conhecimento científico e técnico e das argumentações econômicas e até
emocionais, é indispensável viabilizar a reconexão entre sociedade e natureza,
inclusive de forma coletiva. Como seria de grande interesse a promoção dos sistemas
de áreas protegidas, verde e azuis, se faz necessário o reconhecimento dos
interesses diversos e das múltiplas contribuições dos grupos sociais e a promoção
da participação e do engajamento dos diversos atores, por diferentes tipos de
acordos, parcerias e meios, formais e informais a fim de servir melhor aos
interesses da sociedade. Éindispensável ter uma gestão aberta e inclusiva, com
múltiplas interações com a sociedade, para estimular processos adequados de
participação, contribuição e uso, principalmente local. Isso é o que chamamos
de conservação colaborativa.
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(Disponível apenas na versão impressa)
Capítulo de publicado entre as páginas 238e 261 da obra OVIEDO, A. E. P.; BENSUSAN, N.. (Org.). Como proteger quandro a regra é destruir. Brasília: ISA; Mil Folhas, 2022.