Caso Povo Guarani versus Parques Estaduais Serra do Mar e Jaraguá
RESUMO
O presente texto gira em torno do conceito de floresta cultural, um tipo
de paisagem cultural construída por povos e comunidades tradicionais (PCTs)
floresteiras, ou seja, cujas culturas têm a floresta como elemento central ou
muito importante na manutenção de seus modos de vida. Para isso, buscamos
responder a seguinte questão: É possível identificar florestas culturais em São
Paulo? Há conciliação entre a proteção das florestas e das culturas a elas
associadas? Na tentativa de buscar respondê-las, iniciamos apresentando
resumidamente o conceito de floresta cultural, com alguns exemplos e sua
importância para os PCTs. Em seguida, denotamos o que diferencia um PCT da
sociedade nacional, sobretudo pelo Estado brasileiro, com destaque aos vínculos
estabelecidos com os ecossistemas. Na última parte, para entender melhor o
conflito entre PCTs e UCs, destacamos um caso na capital paulista, o da
sobreposição entre as terras indígenas Guarani do Jaraguá e Tenondé Porã, com
os parques estaduais do Jaraguá e Serra do Mar (Núcleo Curucutu). As conclusões
são de que para se identificar uma floresta cultural em São Paulo é necessário,
além de conhecer suas estruturas e processos ecológicos, o entendimento das
culturas humanas a eles associados. E para protegê-las, é imprescindível o
reconhecimento do papel dos povos e comunidades tradicionais na produção de
paisagens florestais e de outros ecossistemas.
INTRODUÇÃO
A pesquisa centra no conceito
de florestas culturais, apresentado por Willian Ballée (2013) como um tipo de
paisagem cultural. Sueli Furlan (2006) salienta a importancia da
territorialidade humana para a identificação das florestas culturais. Assim, os
povos e comunidades tradicionais (PCTs) são chave para esse entendimento, pois
têm como cosmologia a interconexão com os seres vivos ou não que compartilham o
mesmo território (DIEGUES, 2008). Estas comunidades tradicionais conquistaram
direitos na legislação brasileira para garantir a continuidade de suas culturas
vincuadas à biodiversidade existente em seus territórios (MARETTI; SIMÕES,
2020).
No entanto, há conflito entre os modos-de-vida de PCTs e
a gestão de algumas unidades de conservação, sobretudo os parques nacionais e
estaduais. O conflito enfocados aqui se basea no fato de que para alguns gestores
deste tipo de área protegida não é possível conceber a biodiversidade alvo de
conservação como algo produzido por comunidades pré-existentes ao parque.
Dentro dessa problemática, o objetivo principal do
presente artigo é estudar se o conceito de floresta cultural é utilizado na
gestão de unidades de conservação do tipo parque estadual quando há
sobreposição com territórios de povos indígenas ou outra comunidade
tradicional. Tal estudo justifica-se por dois principais motivos: 1 – dar maior
visibilidade às questões étnicas nos estudos sobre a conservação da natureza; 2
– observar se há entendimento entre gestores de parques do fato de que as
florestas por eles protegidas podem ter sido produzidas por culturais humanas.
O caso aqui escolhido trata da sobreposição territorial
entre dois parques estaduais do Estado de São Paulo: o Serra do Mar e o Jaraguá,
com territórios do povo indígena Guarani.
A metodologia baseou-se na leitura dos planos de manejo de
ambos os parques (SÃO PAULO, 2008; 2010) e nos laudos antropológicos de
reconhecimento das terras indígenas afetadas (BRASIL, 2010; 2013). Neles,
observamos se há o reconhecimento de florestas culturais nas respectivas
unidades de conservação, e se os direitos do povo guarani que habita o mesmo
território dos parques anteriormente à suas criações foram respeitados e em que
medida.
As
conclusões são de que o termo “floresta cultural” inexiste nesses planos, pelo
contrário, a biodiversidade é tida como natural em todos os documentos. E os
direitos territoriais dos povos indígenas que convivem no mesmo espaço dos
parques não são respeitados em sua plenitude.
Concluímos, ainda, que
para se identificar uma floresta cultural em São Paulo é necessário, além de
conhecer suas estruturas e processos ecológicos, o entendimento das culturas
humanas a eles associados. E para protegê-las, é imprescindível o
reconhecimento do papel dos povos e comunidades tradicionais na produção de
paisagens florestais e de outros ecossistemas.
Adaptado de Rodrigo M. Santos (2021).
(...)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No
presente texto, na tentativa de se identificar florestas culturais em São Paulo,
buscamos apresentá-las como uma paisagem cultural fruto da ação de culturas
tradicionais sobre estruturas e processos de ecossistemas florestais.
Atualmente, os povos e comunidades tradicionais que participam dessa produção
são reconhecidos pelo Estado como agentes da sustentabilidade.
Por
outro lado, mesmo com esse reconhecimento, eles enfrentam conflitos com
gestores preservacionistas de unidades de conservação. Para exemplificar esse
conflito, destacamos aqui dois casos envolvendo povos Guarani e parques
estaduais. Para superar esse conflito, é necessário que o Estado e seus agentes
reconheçam que não apenas a floresta, mas os ecossistemas como um todo, são
resultantes de processos históricos que envolvem os povos que neles habitam há
centenas de anos.
Destarte,
para se identificar qualquer floresta cultural é necessário, além de se
conhecer suas estruturas e processos ecológicos, o entendimento das culturas
humanas a eles associados historicamente. E para conservá-las, é imprescindível
o reconhecimento do papel dos povos e comunidades tradicionais na produção
dessas paisagens bioculturais.
Consequentemente,
o esclarecimento de outras questões pode ajudar nesse entendimento, por
exemplo: como identificar quais as estruturas e processos ecológicos são
resultantes de ações culturais? Como saber se uma floresta é de fato cultural?
Onde elas estão espalhadas pela Mata Atlântica e no interior do Estado de São
Paulo? Esses são temas para outras investigações.
Artigo publicado nos anais do XIV NANPEGE - Encontro Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia, organizado pela ANPEGE - Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia; e que ocorreu na cidade de Campina Grande-PB, em 2021. ISSN 2175-8875.
Clique aqui para baixar o material apresentado no evento.
Nenhum comentário:
Postar um comentário